sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Sexta-feira. No final, museu e novos amigos

A previsão do tempo para meu penúltimo dia na Ilha de Páscoa era de chuva. Para não arriscar a tomar mais um banho gratuito, acordei sem pressa. Separei os lugares que não tinha conhecido e dei por perdido. Não iria à montanha Puna Pau, onde eram feitos os pukaus, este símbolo de superioridade que enfeita as cabeças dos moais. Também não subiria o vulcão Poike, o velho Poike. Não contornaria o Terevaka e ignoraria a Casa das duas Ventanas. Tudo bem, já tinha feito muita coisa até então.

Passavam das 11h quando fiz meu café de rei (tomate, ovo, iougurte...). Da janela da cozinha, via a chuva castigar as barracas do hostel e camping Mihinoa. Dei uma folheada em meu livro, mas tinha ainda duas coisas para fazer: ir ao museu e à feira de artesanato.

Hostel Mihinoa e o tempo cinza da Ilha de Páscoa

Tinha adiado demais a ida ao museu. A ideia era visitá-lo primeiro, para, armado de informações, conhecer os locais. Deixei por último. Ao menos pude usar a capa de chuva que comprara nos primeiros dias. Caminhava de chinelo, com as botas em uma mão, um pão entre a outra mão e a boca e duas bolhas no pé, quando Nacho e Vianca passaram por mim com a picape vermelha. Deram uma carona até o museu.

No museu, um exemplo da escrita Rongo-rongo do povo Rapa Nui

Cá entre nós. Não tem nada demais no museu Padre Sebastian Englert. É uma sala grande, cheia de textos nas paredes. Li tudo, tomei notas, tirei fotos. Anotei, por exemplo, que Ilha de Páscoa fica a 3.599 km da costa sulamericana, 4.050 km do Taiti, 2.200 das Ilhas Marquesas e a 2 mil km de Pitcairn, a mais proxima. Páscoa é a ilha habitada mais remota do mundo!

Moai "de mentira" com os olhos esbugalhados e as costas coloridas


Vi também os moais kavakava, uns bonecos de madeira, magros e de bochechas afundadas que eram feitos para dar de presente, em uma época não tão áurea na vida dos Rapa Nui: estes bonecos retratavam exatamente a condição da população que sofria de fome, guerra e miséria.

Um raro exemplar do olho de moai, encontrado no Ahu Nau-Nau

Um dos melhores exemplares do museu é um autêntico olho de moai. Embora tenhamos em mente esta imagem carrancuda das estátuas rapa nui, os moais tinham uns olhos esbugalhados feitos de coral branco (parte branca) e de escória vermelha (íris). O sulco onde eles seriam encaixados era a talhado por último com o moai já de pé sobre o ahu. Este era um dos momentos mais sagrados do ritual.

Complexo Tahai e seus três ahus

Passei uma hora no museu e, estando ali, dei uma última passadinha pelo meu lugar favorito na ilha: o complexo Tahai (alguns leitores mais assíduos anteciparam). Estava em clima de despedida e o tempo ajudava para isso. O céu cinza tirava o azul turquesa do mar, que me recebera em meus primeiros dias. Não veria mais aquele azul, nem do céu, nem do mar.

Entrada de uma casa no complexo Tahai

Novos amigos
 
Chovia fino, caminhei devagar para o hostel, preparei um café e abri o livro do Tim Maia. Estava numa boa quando o corintiano João Neri me chamou a atenção. Ao me ver com a camisa do Timão, já me tratou por amigo. Daniel Oristanio, embora palmeirense, era tão gente boa quanto. Havia tempo que não falava português e pude me atualizar sobre o Campeonato Brasileiro (o Fluminense já era campeão) enquanto tomávamos uma cerveja Escudo - só o João e eu; Daniel é abstêmio.

Esportes aquáticos: as paixões de meus novos amigos. Fotos: João Neri

A dupla sempre viaja juntos. Jovens arquitetos paulistanos, eles teriam uma semana na ilha e queriam, além de conhecer moais e vulcões, surfar e fazer mergulho. Uma pena não tê-los conhecido antes. Após Páscoa, João seguiria viagem para Machu Picchu. Daniel voltaria para casa, trabalhar. Ele é um dos responsáveis pela construção da mega rampa dos X-Games, que acontecem em Foz do Iguaçu. Mundo pequeno, iremos nos cruzar novamente em Itaipu.


Sob o céu cinza, o mar também perdera sua cor

Como a chuva diminuíra, sugeri que fôssemos ao centro de atesanato. Ledo engano. A maldita nos pegou novamente pela estrada, nos empapamos e, quando chegamos, o centro estava fechado. Era 21h, deu tempo, ao menos, de comer um "completo" (o tal sanduíche chileno que conheci na casa de Nacho e Vianca), com meus novos amigos. Um dia quase perdido, não fosse a companhia.

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